Resenha: Carcereiros, de Dráuzio Varella

by - domingo, janeiro 19, 2014

Cumprindo a resolução de postar uma resenha para cada uma das minhas leituras e levando em consideração o fato de que estou atrasada nesse ponto, hoje vou falar em “Carcereiros”, escrito por Dráuzio Varella.



Título: Carcereiros
Autor: Dráuzio Varella
Editora: Companhia das Letras - 232 páginas
Em Estação Carandiru Drauzio Varella focou seu corajoso relato na população carcerária de um dos presídios mais violentos do Brasil. Mas os vinte e três anos atuando em presídios brasileiros como médico voluntário também o aproximaram do outro lado da moeda: as centenas de agentes penitenciários que, trabalhando sob condições rigorosas e muitas vezes colocando a vida em risco, administram essa população. Foi com um grupo desses agentes que Drauzio passou a se reunir depois das longas jornadas de trabalho, em um botequim de frente para o Carandiru. E essa convivência pôs o autor em contato com os relatos narrados em Carcereiros, segundo volume da trilogia iniciada por Estação Carandiru – o terceiro livro, Prisioneiras, terá como ponto de partida o trabalho do médico na Penitenciária Feminina da Capital. Acompanhamos, assim, uma rebelião pelos olhos de quem tenta contê-la. Entramos em contato com o cotidiano dos carcereiros e as situações desconcertantes impostas pelo ofício, que eles resolvem com jogo de cintura e, não raramente, com humor. O que emerge é um retrato franco de um mundo totalmente desconhecido para quem está de fora.

Não é de hoje que gosto do trabalho do Drauzio Varella no que diz respeito à literatura. Comecei com “Estação Carandiru”, li “Por um Fio” que se tornou um dos meus livros favoritos, mas acabei demorando demais para ler algo mais escrito por ele. Também não é de hoje que “Carcereiros” me esperava no Kindle e no Kobo. A coragem só veio depois de ter passado pela terrível experiência com “Páginas de uma História” e desejar algo capaz de “limpar a mente”: momento nos quais normalmente lanço mão da leitura de não ficcção e biografias. Tive de lançar mão do recurso mais cedo do que eu imaginava, mas valeu a pena.

“Carcereiros” é uma espécie de outro lado do que foi mostrado em “Estação Carandiru”. Mostra a vida de quem vive em meio às grades mesmo sendo livre, quase como se fosse um regime semiaberto às avessas. Há histórias tristes, engraçadas e comoventes. Mostra o que foram começos de carreira que quase todos tiveram em comum – a busca pela estabilidade de um emprego público – e o decorrer em que muito da vida desses homens mudou. A metamorfose e o endurecimento como sendo uma mudança natural, a rispidez e a intolerância se tornando uma constante a partir do momento em que esse se tornou o único caminho viável de fazer e sobreviver fazendo o trabalho que ninguém queria.

O livro também traz uma análise interessante do sistema carcerário, contrariando o pessoal do “bandido bom é bandido morto” ou que “bandido merece tudo que passa na cadeia” que adora soltar essas máximas, mas que mudariam logo de ideia e trocariam de convicções se um dos seus entes queridos estivessem do outro lado. Um bom choque de realidade em muitos sentidos, especialmente tendo em mente que eles vivem as regras do mundo do crime mesmo que na teoria estejam livres, e que mesmo em meio a leis draconianas ainda é possível demonstrar alguma humanidade, mesmo quando parecem se deparar com o mal absoluto.

Para quem tem curiosidade a respeito do mundo carcerário, é um livro bem interessante. E merece quatro corujas na escala de classificação desse humilde blog.

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